É possível o retorno das empregadas gestantes imunizadas às atividades presenciais?

Atualização das notícias trabalhistas acerca da COVID 19.

Inúmeras empresas têm em seu quadro de funcionários, colaboradoras gestantes que precisaram ser afastadas de seus postos de trabalho em maio do corrente ano, quando o governo sancionou a Lei nº 14.151.

            A referida lei, ainda vigente, proíbe expressamente que empregadas gestantes exerçam as atividades de trabalho de forma presencial durante o estado de emergência de saúde pública, decorrente da pandemia do coronavírus.

            Contudo, uma questão acerca do tema tem sido recorrente: A empregada gestante quando totalmente imunizada, poderia retornar ao trabalho de forma presencial?

O que diz a lei

            Até o presente momento não há previsão legal que ampare o retorno das empregadas gestantes às atividades presenciais. Conforme dispõe o parágrafo único da aludida lei, a empregada gestante somente estaria autorizada a exercer suas atividades por meio de umas das modalidades de trabalho à distância, a exemplo do home office.

            Desta forma, não é possível que o empregador exija o retorno das empregadas gestantes para prestarem seus serviços no estabelecimento da empresa neste momento, ainda que devidamente imunizadas com as duas doses da vacina.

            Há que se registrar que, não obstante a lei ser omissa em relação às gestantes vacinadas, não há previsão do tempo de duração do estado de emergência de saúde pública, e tampouco quais seriam os efeitos jurídicos de seu descumprimento.

Leia também: A recusa à imunização viabiliza a demissão por justa causa?

            De todo modo, especialistas cogitam que tal previsão de estado de emergência se findaria quando os 70% da população estiverem vacinados com todas as doses, contudo, trata-se de mera especulação sem embasamento legal. Atualmente é sabido que, apenas 37%[1] da população brasileira foi totalmente imunizada.

Decisão do Tribunal Regional do Trabalho

            Em decisão recente de 10 de setembro deste ano, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª região [2] negou liminar requerida por empresa terceirizada para retorno de gestante ao trabalho presencial. A empresa argumentou a existência de decreto em São Paulo prevendo o encerramento da quarentena em 16 de agosto do corrente ano.

            O Desembargador ressaltou que, a imunização de parte da população e a redução do número de mortalidade em decorrência do vírus não são suficientes para a retomada das atividades presenciais, uma vez que “novas variantes têm eclodido no mundo inteiro e também em nosso território”

            Por ora, nenhuma gestante poderá ser demitida, ressalvadas as hipóteses de justa causa, entre elas, a recusa a prestar os serviços de forma remota, quando determinado pelo empregador (ato de insubordinação artigo 482 “h” da CLT).

            As empresas cujas atividades exercidas não possibilitem a realização do trabalho remoto, deverão garantir o pagamento da remuneração a todas as empregadas gestantes, enquanto durar o período de afastamento, salvo os casos de gravidez de risco ou algum outro fator que fundamente o pedido de auxilio doença junto ao INSS.

            Há registros de que foram levados à justiça, casos de afastamento de gestantes, em que os empregadores entenderam incumbir ao Poder Público a responsabilidade do pagamento nos casos em que a atividade exercida não viabilize o trabalho à distância.

            Em duas situações, juízes de primeiro grau entenderam não poder ser direcionado ao empregador o ônus imposto pela lei 14.151/21, e optaram por deferir o pedido liminar para transferir ao INSS o dever de custeio do período de afastamento das gestantes, configurando assim, uma forma de antecipação do pagamento do benefício de salário maternidade desde o afastamento.

            Ocorre que, a Turma Nacional de Uniformização (TNU), por meio do julgamento PEDILEF Nº 0502141-97.2019.4.05.8501/SE[3], entendeu que não caberia ao poder judiciário transformar o auxílio-doença em política pública de assistência social para enfrentamento da pandemia, sem existência de previsão legal (artigo 195, § 5º da Constituição Federal)[4] por entenderem que se estaria criando uma outra forma de concessão de benefício de salário-maternidade, além das já previstas na lei 8.213/1991, reformando assim a decisão do magistrado de primeiro grau.

Medidas Provisórias

            Ato contínuo, vale também ressaltar, em que pese as Medidas Provisórias 1045 e 1046, as quais dispuseram acerca da suspensão do contrato de trabalho e redução de jornada, antecipação de férias e realização de banco de horas, terem perdido sua validade, uma vez que não foram aprovadas pelo Senado, encontra-se em tramitação na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 2058/21[5].

            Este projeto dispõe que, o ônus do afastamento não deverá recair sobre o empregador, e que, nos casos de empregadas gestantes, cujas atividades não sejam passíveis de execução de forma remota, deverá ser pago um benefício emergencial de manutenção de emprego e renda, prevendo ainda, a possibilidade de antecipação de férias, realização de banco de horas e adiamento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS).

            Enquanto o projeto de lei não é votado e aprovado, as empresas precisam garantir a remuneração das gestantes afastadas.

            Espera-se que em breve tal situação seja regulamentada por uma nova lei que estabeleça de forma clara as diretrizes a serem observadas. Por tal motivo, importante que as empresas consultem seu advogado antes da adoção de qualquer medida que determine o retorno das gestantes afastadas em decorrência da Lei.

Artigo escrito pela Dra. Simone Siqueira


[1] https://www.gazetadopovo.com.br/republica/breves/mais-de-37-da-populacao-brasileira-esta-totalmente-imunizada-covid/

[2] https://www.conjur.com.br/2021-set-17/desembargador-garante-afastamento-remunerado-empregada-gestante

[3] PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI FEDERAL. PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE AUXÍLIO-DOENÇA. LAUDO MÉDICO PERICIAL QUE RECONHECE A CAPACIDADE PARA O TRABALHO E QUE NÃO É AFASTADO PELA TURMA DE ORIGEM. BENEFÍCIO DEFERIDO COM FUNDAMENTO NA PANDEMIA DE COVID-19. IMPOSSIBILIDADE DE CRIAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA PELO PODER JUDICIÁRIO. INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO.

1. O Juiz não está adstrito ao laudo pericial, podendo formar seu convencimento com outros elementos ou fatos provados nos autos. Portanto, com base no livre convencimento motivado, o Magistrado pode reconhecer a incapacidade para o trabalho e conceder o benefício previdenciário de auxílio-doença, afastando-se da conclusão do laudo médico judicial.

2. Sem se afastar da conclusão pericial e criando verdadeira política pública, o julgado recorrido equiparou as limitações sociais decorrentes do momento de pandemia, como a dificuldade de acesso aos serviços públicos e a necessidade de isolamento social, à incapacidade “para o seu trabalho ou para sua atividade habitual por mais de 15(quinze) dias consecutivos”, conforme previsão do art. 59 da Lei n.º 8.213/1991.

3. No que tange às políticas públicas destinadas à assistência no período de pandemia, especialmente no curso do ano de 2020, Poder Executivo e Legislativo fizeram sua opção de como assistir a população mais desfavorecida, criando o auxílio-emergencial previsto na Lei n.º 13.982/2020, entre outras providências.

4. Assim, deve a decisão recorrida ser reformada, pois não cabe ao Poder Judiciário, subvertendo a lógica do auxílio-doença, transformá-lo em política pública de assistência social para enfrentamento da pandemia de COVID-19.

5. Incidente conhecido e provido.

ACÓRDÃO

A Turma Nacional de Uniformização decidiu, por unanimidade, CONHECER E DAR PROVIMENTO ao incidente de uniformização interposto pelo INSS, restabelecendo a sentença de 1º grau de jurisdição.

Fonte: Processo nº 0502141-97.2019.4.05.8501

[4] artigo 195 § 5º CF “Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”

[5] https://www.camara.leg.br/propostas-legislativas/2285889

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